quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

A Rainha Jovelina Pérola Negra


Nunca houve uma partideira como Jovelina Pérola Negra. Afiada, desbocada, a
cantora versava sobre qualquer tema, tirava sarro da cara dos homens, não
ficava atrás de ninguém nas rodas de partido alto. Páreo para ela, só Zeca
Pagodinho e Arlindo Cruz. E olhe lá. Marcelo D2 lembra o dia em que foi à
quadra do Cacique de Ramos, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e viu Jovelina
pela primeira vez, rimando com Zeca e Arlindo. “Foi um baque. Só queria
saber que nega era aquela que botou todo mundo no chinelo, embrulhou e levou
para casa”, conta ele, um dos 17 convidados do disco Jovelina duetos – É
isso que eu mereço, recém-lançado pela Som Livre.

Produzido por Marcos Salles, o álbum traz de volta o bom repertório da
cantora, que morreu em 2 de novembro de 1998, de infarto, aos 54 anos. Nas
14 faixas, Jovelina “divide” a voz grave com companheiros do Cacique de
Ramos, como Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz, Beth Carvalho, Jorge Aragão, Almir
Guineto, Leci Brandão, o grupo Fundo de Quintal. Também “desafia” fãs da
nova geração, entre eles, D2, Zélia Duncan, Juliana Diniz, Ana Costa, Seu
Jorge e o grupo Revelação. Apesar dos estranhos diálogos do além – “E aí,
Jojô?!”, “Dona Jove, lembra do pagodão?”, “Faz aí, Jovelina!” –, os duetos
caem bem, com acertada seleção de músicas e convidados.

Arlindo e Zeca abrem o disco emendando, numa talagada só, três sucessos, Luz
do repente, Feirinha da Pavuna e Bagaço da laranja (a única parceria dos
três). D2 vem na seqüência, misturando rap com samba na ótima Catatau.
Alcione, em Liberdade plena; Leci Brandão, em No mesmo manto; e Beth
Carvalho, em Sonho juvenil (“Ai, que vontade que eu tinha/ De ter um carango
joinha”), são outros pontos altos. Zélia Duncan encerra o álbum com lindo
samba, Laços e pedaços. Cassiana e Kamilla, filha e neta de Jovelina, também
estão no disco, na faixa É isso que eu mereço. É uma participação afetiva,
bonita, mas não vai muito além disso.

No DVD distribuído à imprensa, com depoimentos sobre a partideira, Cassiana
conta que tinha vergonha de cantar na frente da mãe. Parte do temor vinha do
fato de Jovelina gravar disco, chegar em casa com a cópia e achar tudo um
horror. Ela falava o que bem queria. Falava sozinha, inclusive, enquanto
lavava roupa. “Ficava debruçada na área, conversando com ela mesma,
perguntando e respondendo, xingando os contratantes (dos shows)”, lembra a
filha, aos risos.

Pelo que os amigos e a filha contam, Jovelina Farias Belford (era esse o
nome dela) era uma figura. Comprava boneca para a filha e ela mesma
brincava. Ia ao shopping com o neto e ficava pelos corredores, dando susto
em quem passava. Obrigava os filhos a pedir bênção para os mais velhos, não
deixava ninguém olhar para dinheiro de igreja. Proibia palavrão em casa, mas
soltava a toda hora um mais cabeludo do que o outro.

Da Jovelina “séria”, Zeca Pagodinho não se lembra de quase nada. Guarda na
memória cenas engraçadas, como o dia em que ela chegou à festa da mulher
dele, eufórica com a cirurgia de mama que havia feito, mostrando os
“peitinhos de moça” lá do portão. “Jojô era parceirona”, diz o cantor, que
estreou em disco ao lado dela, no LP Raça brasileira, de 1985. “Boa de
chinfra, o negócio era atiçá-la, falar alguma coisa para que xingasse
bastante. Ela teve grande importância naquele movimento nosso. Pena que
durou muito pouco.”

Leci Brandão ressalta a facilidade que ela tinha em versar, sua
especialidade em zoar com os outros, a humildade que demonstrou a vida
inteira. Almir Guineto, que participa do álbum com Menina, você bebeu, conta
que era perigoso versar com a amiga. “Se fizesse escada para ela, se eu
cantasse primeiro, ela me esculachava”, ele ri. Arlindo Cruz também cai na
risada quando lembra os conjuntos de oncinha que ela vestia, as “saliências”
que falava nas rodas de partido alto.

Ademir e Ubirany, ambos do Fundo de Quintal, repetem a história mais famosa,
do dia em que ela pediu um adiantamento, durante temporada no Teatro João
Caetano, no Rio. Ao ouvir que colocariam (o valor) no borderô, ela se saiu
com esta: “Ninguém põe no meu borderô! Nem meu marido! Tá pensando que é
assim?” Era uma peça rara.
Texto tirado correio web. Sônia Palhares

Um comentário:

Flávia Muniz Cirilo disse...

oi. não sei como entrei na sua lista. mas resolvi visitar aqui.
quero conhecer a lona da pavuna! abraço